“Você consome bebida alcoólica? Não, só cerveja.” Essa foi uma resposta comum que Izabella Alvarenga Silva escutou nas entrevistas para o mestrado sobre ingestão de álcool por alunos do Ensino Médio. Para o orientador dela, Raul Aragão Martins, psicólogo e professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), isso mostra como passamos mensagens contraditórias aos jovens. “Culpabilizamos as substâncias ilícitas, mas fazemos propagandas glamourosas de cerveja, naturalizando seu uso.”
Hoje, o álcool é a substância psicoativa mais consumida entre os alunos. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2012, 26,1% dos estudantes do 9º ano tinham ingerido bebidas alcóolicas no último mês e a porcentagem de quem fumou maconha no mesmo período ficou em 2,5%. Outros estudos, conduzidos pela equipe de Raul, apontam que 95% dos jovens envolvidos com produtos ilícitos começaram consumindo álcool.
Sendo assim, mesmo que na sua escola não haja um problema eminente relacionado ao uso de drogas ilegais, não se pode ignorar o tema. “Os desafios são grandes. Mas, se enfrentarmos a questão coletivamente, poderemos ajudar os alunos a refletir e a se posicionar de maneira crítica em relação a ela, fazendo escolhas conscientes”, defende Antonio Carlos Egypto, psicólogo e coautor do livro Drogas e Prevenção – A Cena e a Reflexão (80 págs., Ed. Saraiva). Um bom caminho é desenvolver um projeto institucional. Assim, todos os segmentos da instituição poderão planejar ações integradas e que partam da mesma perspectiva.
Abordagem e atuação
O sucesso do projeto depende do envolvimento de professores e funcionários. O vínculo de confiança, essencial para que os alunos dividam dúvidas e se sintam acolhidos, é criado mais facilmente com quem os acompanha todo dia.
Mas não adianta uma ação pontual e sem sentido para os jovens. É importante pensar na concepção dela. Os adolescentes não dialogam com práticas baseadas na ideia de “Diga não às drogas” e elas não os faz refletir sobre os fatores facilitadores do abuso de psicotrópicos. Além disso, essa abordagem está amparada na transmissão de informações que se valem do amedrontamento e do apelo moral para persuadir as pessoas para a abstinência. “É simplista propagar que essas substâncias matam e que só por experimentá-las fica-se dependente.
Quando puder conversar com alguém que faz uso de drogas, o jovem vai saber que não é assim que funciona”, alerta Antonio. O debate deve ser franco e sem preconceitos para quebrar mitos e esclarecer sobre riscos e efeitos.
Partindo desse pressuposto, é preciso repensar os convites à polícia para trabalhar o tema dentro da escola. Por ser uma força de segurança, ela adota, geralmente, uma perspectiva mais repressiva sobre a questão. Além disso, a figura do policial, a depender do contexto da comunidade onde a instituição está inserida, nem sempre é positiva. Outro cuidado é não chamar ex-usuários para dar depoimentos. Vários estudos mostram que, muitas vezes, o adolescente interpreta a mensagem da seguinte maneira: “Se ele entrou e saiu das drogas, eu também posso entrar e sair”.
Quando se tem claros esses pontos, a prevenção passa a incluir atividades que permitam a formação, o debate ou a adoção de práticas de redução de danos. Na EE Professor Jamil Khauan, em São José do Rio Preto, a 442 quilômetros de São Paulo, os docentes realizaram uma capacitação, em parceria com a Unesp, para desenvolver um trabalho de diminuição do consumo de álcool entre os estudantes, baseados pelos resultados de um questionário aplicado previamente. “Fizemos conversas individuais, nas quais falamos sobre o padrão de uso do aluno, explicamos os perigos, esclarecemos dúvidas e traçamos, juntos, metas a serem alcançadas até o encontro seguinte”, explica Terezinha Feres de Oliveira, coordenadora da área de Ciências Biológicas da escola. A estratégia levou à redução na ingestão e na frequência de vezes em que os jovens bebem. A moderação já é um avanço e evita situações de vulnerabilidade propiciadas pelo uso desequilibrado do álcool, como brigas, acidentes e sexo desprotegido.
Trabalhar cidadania e respeito à diversidade também torna os alunos menos suscetíveis ao consumo dessas substâncias. Sabendo disso, a diretora Rosimeire Guerra, do CE Félix Mendonça, em Itabuna, a 355 quilômetros de Salvador, promove rodas de debate mensais sobre o tema e atividades que visam o protagonismo juvenil e o fortalecimento da comunidade, como aulas de dança e de esporte e visitas às famílias. “Também temos o Escuta-me, no qual ouvimos as sugestões dos estudantes”, diz a gestora. Para ela, o principal benefício das iniciativas é o fato de todos os jovens, independentemente de usarem ou não drogas, se sentirem acolhidos e não discriminados.