As intervenções breves para o uso de drogas

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define intervenções breves como “práticas que visam identificar um problema real ou potencial de álcool (ou outra droga) e motivar um indivíduo a fazer algo a respeito”.

Elas incluem triagem e avaliação, o que permite que o clínico forneça informações e conselhos para reduzir o consumo de álcool ou outras drogas de risco e problemas relacionados.

Geralmente, são oferecidos a pessoas que não procuraram tratamento ou assistência, mas que foram identificadas por meio de triagem de rotina.

As intervenções breves visam informar as pessoas de que elas estão bebendo ou usando drogas em níveis que aumentam o risco de desenvolver transtornos de abuso ou dependência e incentivá-las a diminuir o consumo para reduzir o risco.

Elas geralmente não são eficazes em pessoas que desenvolveram dependência ou que estão sofrendo danos graves relacionados às drogas. Para essas pessoas, as intervenções de tratamento mais intensivo por serviços especializados em drogas e álcool são mais eficazes e recomendadas.

Mas não é necessário esperar o problema estar instalado para iniciar as intervenções. É possível fazê-las também para a prevenção ao uso de substâncias nas consultas pediátricas ou em conversas com as famílias, que são chamadas de “aconselhamento breve”.

É o que faz em seu consultório o Dr. João Paulo Becker Lotufo, pediatra que atualmente coordena o projeto antitabágico do Hospital Universitário da USP e é responsável pelo Projeto antitábagico Dr. Bartô, Doutores da Saúde, profilaxia de tabagismo, gravidez precoce e álcool em escolas de São Paulo. Ele também é responsável pela questão de drogas nas Sociedades Brasileira de Pediatria e Sociedade de Pediatria de SP.

Ele irá abordar o “Aconselhamento Breve sobre Álcool e outras Drogas” durante o 7º Congresso Internacional Freemind, de 15 a 18 de junho de 2022, no Expo Dom Pedro, na cidade de Campinas/SP.

Para Dr. Lotufo, aconselhamento breve nada mais é do que “gastar” alguns minutos tratando da questão do álcool e das drogas, bem como da prevenção para não usuários. Durante as consultas habituais, ou durante as refeições de família, pode-se seguir uma orientação padrão com perguntas para abordar os pacientes ou familiares sobre a questão de álcool e drogas.

O diagnóstico das possíveis drogas lícitas ou ilícitas presentes nas casas das famílias é fundamental para o preparo do plano de atendimento sobre estas questões em todas as situações.

Inicialmente é feita uma pesquisa para saber se há pais fumantes, alcoólatras, usuários de maconha ou crack nas famílias. A partir daí, conversa-se, gastando, no bom sentido, minutos suficientes para informar e aprimorar a discussão sobre as drogas em casa, reverberando a mensagem do aconselhamento.

A presença desta discussão aliada às trocas de ideias com a família, segundo Dr. Lotufo, foi o único fator positivo na diminuição da experimentação de drogas pelos jovens, superando a presença de espiritualidade, esportes, atividades culturais ou sociais numa pesquisa que ele realizou em 10 escolas da região do Butantã em São Paulo.

Ainda segundo Lotufo, a intervenção breve é uma conversa mais dirigida para os usuários de álcool e/ou drogas. Esta é um pouco mais elaborada e leva um pouco mais de tempo e dedicação.

Saiba mais sobre as intervenções breves.

 

Como e quando são realizadas as intervenções breves?

Médico que faz intervenções breves

Embora as intervenções breves tenham se concentrado amplamente em ambientes de atenção primária, qualquer profissional de saúde com treinamento adequado pode realizá-las.

O uso de computadores para fornecer ferramentas de triagem também foi apontado como mais viável do que questionários em papel e caneta. A internet e os dispositivos móveis oferecem novas possibilidades de intervenções autônomas ou facilitadas e também trariam benefícios como maior validade e anonimato.

O momento em que se deve realizar as intervenções breves também é uma área de muita confusão. Elas podem ser prontamente executadas nos seguintes cenários:

  • Com todos os novos pacientes
  • Durante avaliações de saúde
  • Durante avaliações de doenças crônicas, por exemplo, hipertensão, diabetes, doença do refluxo gastroesofágico, testes de função hepática anormais.

 

Intervenções breves funcionam?

Muitos ensaios e meta-análises indicam que intervenções breves são eficazes como estratégias de prevenção secundária, principalmente quando direcionadas ao consumo de álcool.

Uma meta-análise de 1997, descobriu que os bebedores pesados ​​eram duas vezes mais propensos a reduzir seu consumo 6 a 12 meses após uma breve intervenção do que aqueles que não receberam nenhuma.

Da mesma forma, um estudo da OMS realizado em oito países com mais de 1.600 participantes, descobriu que intervenções breves reduziram o consumo diário de álcool em 17% e a intensidade do consumo em 10%.

 

Recursos práticos para apoiar intervenções breves

Uma barreira crítica para a implementação de intervenções breves é a falha na triagem e detecção de indivíduos em risco de desenvolver problemas com álcool e outras drogas.

Na prática geral, isso tem sido associado ao acesso limitado a recursos, falta de tempo, cargas de trabalho pesadas, falta de confiança e preocupações em levantar questões delicadas ou privadas.

Existem várias estruturas agora em vigor para orientar os médicos sobre a triagem ou avaliação apropriada e vamos te apresentar duas que podem te ajudar. A primeira (tabela 1) é resumida como ‘FLAGS’ – Feedback, Listen, Advice, Goals, Strategies (Tabela 1) e a segunda é conhecida como Escala de Gravidade da Dependência (Tabela 2).

 

Tabela 1 – FLAGS para problemas com álcool

FLAGS é um acrônimo útil que te ajuda a identificar os ingredientes para a realização de intervenções breves.

 

Feedback (Comentar)

  • Fornecer feedback individualizado sobre os riscos associados ao consumo continuado, com base nos padrões atuais de consumo, indicadores de problemas e estado de saúde.
  • Discuta os potenciais problemas de saúde que podem surgir do uso de álcool de risco.
 

Listen
(Ouvir)

  • Ouça a resposta do paciente.
  • Isso deve desencadear uma discussão sobre o consumo do paciente e como ele se relaciona com o consumo da população em geral e quaisquer falsas crenças mantidas pelo paciente.
 

Advice
(Aconselhar)

  • Dê conselhos claros sobre a importância de mudar os padrões de consumo atuais e um nível recomendado de consumo.
  • Uma intervenção breve típica de 5 a 10 minutos deve envolver conselhos sobre como reduzir o consumo de maneira persuasiva, mas sem julgamento.

·         O aconselhamento pode ser apoiado por materiais de auto-ajuda que fornecem informações sobre os danos potenciais do consumo de álcool de risco e podem fornecer motivação adicional para a mudança.

 

Goals
(Metas)

  • Discutir os limites de consumo seguro e ajudar o paciente a estabelecer metas específicas para mudar os padrões de consumo.
  • Instilar o otimismo no paciente de que seus objetivos escolhidos podem ser alcançados.
  • É nesta etapa, em particular, que as técnicas de aumento da motivação são usadas para incentivar os pacientes a desenvolver, implementar e comprometer-se com planos para parar de beber.
 

Strategies
(Estratégias)

  • Peça ao paciente para sugerir algumas estratégias para alcançar esses objetivos.
  • Essa abordagem enfatiza a escolha do indivíduo de reduzir os padrões de consumo e permite que ele escolha a abordagem mais adequada à sua própria situação.
  •  O indivíduo pode considerar estabelecer um limite específico para o consumo de álcool, aprender a reconhecer os antecedentes do beber e desenvolver habilidades para evitar beber em situações de alto risco, acompanhar o ritmo de beber e aprender a lidar com os problemas cotidianos que levam ao consumo.

Fonte: Australian Government – Department of Health

 

Tabela 2 – Escala de Gravidade da Dependência

Existem também ferramentas mais sutis para orientar o processo de avaliação, como a Escala de Gravidade da Dependência, que foi concebida para fornecer uma escala curta e de fácil administração para medir o grau de dependência de diferentes tipos de drogas.

A pontuação está relacionada a padrões comportamentais de consumo de drogas que são, por si só, indicadores de dependência, como dose, frequência de uso, duração do uso, uso diário e grau de contato com outros usuários de drogas.

Também mostra validade na medida em que os usuários de drogas que procuraram tratamento em serviços especializados e não especializados para problemas com drogas têm pontuações mais altas na escala do que as amostras sem tratamento.

A escala contém cinco itens, todos explicitamente preocupados com componentes psicológicos da dependência, incluindo controle prejudicado sobre o consumo de drogas e preocupação e ansiedade sobre o uso de drogas. Estes incluem:

No mês passado…

Pontuação

1. Você já pensou que seu uso de [droga nomeada] estava fora de controle?

Nunca
Às vezes
Frequentemente
Sempre

 

 

 

0

1

2

3

2. O pensamento de não poder obter nenhuma [droga nomeada] realmente o estressou?

Nunca
Às vezes
Frequentemente
Sempre

 

 

0

1

2

3

 

3. Você se preocupou com o uso de [droga nomeada]?

Nunca
Às vezes
Frequentemente
Sempre

 

 

0

1

2

3

4. Você já desejou poder parar?

Nunca
Às vezes
Frequentemente
Sempre

 

 

0

1

2

3

5. Quão difícil você acharia parar ou ficar sem?

Nada difícil
Bastante difícil
Muito difícil
Impossível

 

 

0

1

2

3

A pontuação maior ou igual à 4 é positiva para dependência de substâncias
Fonte: Adaptado de 
Wiley Online Library

 

Conclusão

Embora evidências recentes sugiram que podem haver motivos para questionar se as intervenções breves funcionam na prática clínica de rotina, em alguns indivíduos elas certamente farão a diferença.

Uma abordagem pragmática seria garantir que todos os pacientes sejam questionados sobre o uso de drogas e álcool em primeira instância. Isso permite avaliações adicionais para determinar os danos atuais.

Aconselhamento pode ser dado se seu uso for prejudicial e metas de mudança podem ser estabelecidas. Isso deve ser repetido sempre que possível.

No mínimo, pode ajudar a iniciar uma conversa com alguém que pode refletir sobre seu comportamento e considerar fazer algumas mudanças positivas em sua vida.

 

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Fonte: NPS MedicineWise