A adolescência é a etapa da vida compreendida entre a infância e a fase adulta, marcada por um complexo processo de crescimento e desenvolvimento biopsicossocial. É uma época de grandes transformações, de descobertas, de rupturas e de aprendizado e, por isso mesmo, uma fase que envolve riscos, medos, amadurecimento e experimentações de muitos dos comportamentos adultos.
Dentre as numerosas discussões que envolvem essa fase da vida, vem se somar o uso de drogas em sua ampla gama de possibilidades, desde as lícitas, como álcool e tabaco, até as ilícitas, como maconha, cocaína e ecstasy para recreação ou festas, entre muitas outras. Sabe-se que o uso dessas substâncias é fator desencadeador de acidentes, violência, suicídios, gravidez precoce e doenças de transmissão sexual.
O Estatuto da Criança e do Adolescente considera adolescente, o indivíduo na faixa etária de 12 a 18 anos. Em 2011, havia no Brasil cerca de 78,5 milhões de crianças, adolescentes e jovens, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
A grande maioria dessas crianças e adolescentes, ainda segundo o IBGE, frequenta a escola: 97,2% e 83,7%, para as faixas etárias de 6 a 14 anos e de 15 a 17 anos, respectivamente. Assim, é necessário considerar a escola um espaço privilegiado para implementação de políticas públicas, como as voltadas à saúde coletiva, para pessoas nessa faixa etária.
Dentro desse contexto, o Ministério da Saúde e o IBGE constituíram parceria para a realização da segunda Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) em 2012, com o intuito de descrever as prevalências dos fatores de risco e proteção de doenças crônicas não transmissíveis em adolescentes, visando orientar políticas públicas de promoção da saúde nesse grupo etário.
Os resultados desta pesquisa apontam altas proporções de utilização precoce de álcool entre os adolescentes. Considerando que a pesquisa foi realizada com indivíduos na faixa etária dos 13 aos 15 anos e que no Brasil é proibida a venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, trata-se de um uso precoce e indevido.
Entre os escolares que consumiram bebida alcoólica 30 dias antes de responder ao questionário da PeNSE, as formas mais comuns de obtê-la foram em festas, com amigos, ou comprando no mercado, loja, bar ou supermercado ou mesmo na própria casa.
A iniciação precoce do uso dessas substâncias pode causar consequências devastadoras para a vida adulta desses adolescentes. Quanto mais precoce a experimentação, piores serão as consequências e maior o risco de desenvolvimento de abuso e de dependência.
O estudo mostrou um aumento da experimentação, consumo atual e episódios de embriaguez entre as meninas e isto parece ser resultado das mudanças de comportamento que vêm ocorrendo nas últimas décadas, quando elas passaram a ter mais liberdade para frequentar lugares e festas antes restritos aos adolescentes do sexo masculino.
Essa modificação no consumo de álcool pelo sexo feminino é considerada prejudicial devido a peculiaridades fisiológicas das mulheres. Elas apresentam níveis sérios da enzima álcool-desidrogenase mais baixos, maior proporção de gordura em relação à água corporal e variações da metabolização do álcool nas diferentes fases do ciclo menstrual. Tais características podem resultar em dependência química mesmo em menores quantidades e com maior efeito deletério ao álcool quando comparadas aos homens.
A prevalência maior de experimentação e consumo atual de bebidas alcoólicas entre os alunos de escolas privadas parece estar relacionada ao maior poder aquisitivo tanto para a compra da bebida quanto para frequentar festas e baladas, embora possamos dizer que as bebidas alcoólicas estejam acessíveis a todas as classes sociais.
Embora a experimentação e o consumo atual de bebidas alcoólicas entre os alunos de escolas particulares tenham se revelado maiores, a prevalência de episódios de embriaguez se apresenta maior entre os alunos de escolas públicas. Esse fato precisa ser elucidado por outros estudos.
Alguns estudos evidenciam que os meninos apresentam taxas de “beber pesado” maiores do que as das meninas. As pesquisas apontam que os adolescentes de ambos os sexos consomem praticamente os mesmos tipos de bebidas, com as mesmas frequências, consumindo apenas quantidades diferentes, e os meninos parecem ingerir mais que as meninas.
O uso de drogas ilícitas (maconha, cocaína, crack, heroína, LSD, ecstasy etc.) também foi considerado alto entre os escolares pesquisados, com maior prevalência de consumo entre os escolares do sexo masculino e entre os escolares das escolas públicas.
O aumento da experimentação de drogas entre jovens tem se tornado um sério problema em muitos países. A droga ilícita mais consumida na Europa e nos Estados Unidos é a maconha. O uso de Cannabis entre jovens pode ser um preditivo de desajustes psicossociais e elevada chance de dependência na vida adulta.
Muitos estudos apontam outras relações entre o uso de drogas e comportamento de risco para HIV. As práticas sexuais na maioria das vezes são desprotegidas, já que a intoxicação diminui a vigilância e o julgamento, prejudicando a adoção de práticas mais seguras como o uso de camisinha.
Os resultados da PeNSE 2012 também mostraram que, considerando exclusivamente os escolares que usaram drogas ilícitas pelo menos uma vez, 34,5% utilizaram maconha e 6,4% consumiram crack nos 30 dias que antecederam a pesquisa. Em relação ao conjunto de escolares frequentando o 9ọ ano do Ensino Fundamental, 0,5% relataram o uso de crack no período. Considerando o quão esses dois tipos de drogas são nocivos à saúde, faz-se necessária a urgente tomada de medidas para reverter esse quadro.
Os resultados da pesquisa e da análise reforçam a importância que devemos dar à experimentação e consumo de álcool e outras drogas na adolescência. O aumento do consumo e a iniciação cada vez mais precoce comprovam que nossos jovens estão expostos a inúmeros fatores de risco para a saúde.
Sabemos que os resultados efetivos de qualquer política de prevenção ao uso e abuso de substâncias psicoativas só serão observados a médio e longo prazos; portanto, as intervenções educativas precisam ser articuladas intersetorialmente de maneira continuada, respeitando o contexto e as particularidades de cada região e de cada grupo. As parcerias entre os diversos setores da sociedade, como saúde, educação, assistência social, segurança pública, esporte e lazer, entre outras, ganham especial importância no enfrentamento desse problema dentro do que preconiza a Política Nacional de Promoção da saúde.
Fonte: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-69762014000200005&lng=pt&nrm=iso